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Alentejo: Crescimento da agricultura intensiva considerado negativo pela LPN!

A Liga para a Proteção da Natureza, através de comunicado emitido na sua página oficial, destaca negativamente a progressão da agricultura intensiva no Alentejo.

Em jeito de balanço, a LPN refere que 2021 acaba de forma muito positiva, com a proposta de criação da Reserva Natural da Lagoa dos Salgados, que poderá vir a tornar-se na primeira área protegida terrestre a ser criada em Portugal em mais de 20 anos. São ótimas notícias, porque o nosso país e o mundo precisam de mais áreas dedicadas à conservação da Natureza. Mas tão marcante como este desígnio, é garantir que a gestão destas áreas se torne mais efetiva. E aí (e noutros desafios) 2021 não deixará tão boas memórias.

As Nações Unidas almejam ver 30% dos oceanos com algum estatuto de proteção, e nesta matéria são visíveis os esforços nacionais para que a meta se concretize. A nova Área Marinha Protegida (AMP) da Corrente do Atlântico e da bacia do monte submarino Evlanov ao largo dos Açores, e a expansão da Reserva Natural das Ilhas Selvagens, criada há 50 anos, que a tornará na maior AMP da Europa e de todo o Atlântico Norte realçam o papel que as regiões ultraperiféricas podem desempenhar neste contexto. Também no Algarve se procura criar o Parque Natural Marinho do Recife do Algarve – Pedra do Valado, a primeira com origem num processo participativo, iniciado pela Liga para a Protecção da Natureza em 2014 e que recentemente renasceu. Portugal assume assim um lugar cimeiro na conservação dos oceanos, e a recente atribuição do Prémio Pessoa 2021 a Tiago Pitta e Cunha veio precisamente reforçar esta missão nacional. 

A aprovação da Lei de Bases do Clima, que condensa orientações para a política climática portuguesa e assume metas nacionais de redução de emissões de gases doe efeito de estufa mais ambiciosas que as anteriores, admitindo a antecipação da neutralidade carbónica do país é outro dos acontecimentos a celebrar este ano. Assim como o encerramento das centrais a carvão (Pego e Sines), que, todavia, não deixam esquecer as consequências do desregrado avanço das energias renováveis, mormente a solar1. A ausência de uma Avaliação Ambiental Estratégica para a desejável expansão das centrais solares debilita o potencial de um aproveitamento justo e ponderado deste recurso importantíssimo, estando nalguns casos a colocar em causa património, solos férteis, ecossistemas e o bem-estar de populações.

As boas e semi-boas notícias de 2021 ficam por aqui. As más notícias, e o que permanece por resolver em 2022, rivalizam com o que de bom aconteceu, deixando incerto o lado para o qual tende a balança.

Os planos estratégicos e estruturantes que vimos ser apresentados deixaram vazia a esperança de que a defesa do ambiente pesasse determinantemente nas decisões que irão moldar os próximos anos.  O Plano de Recuperação e Resiliência, apesar de incluir aspetos positivos, apresentou investimentos com impacte ambiental negativo, como a aposta no projeto do Empreendimento de Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato (barragem do Pisão)2, e deixou vazio o seu pleno aproveitamento para a correção de problemas ambientais. Neste âmbito, soma-se ainda o túnel barragem do Cabril-Belver, a barragem de Ocreza e o megalómano projeto de açudes e barragens no Médio Tejo, ascendendo a quantias de várias centenas de milhões de euros. O Plano Estratégico da Política Agrícola Comum para Portugal escusou-se a inscrever verdadeiras preocupações ambientais3, não cumprindo os objetivos da Estratégia Europeia do “Prado ao Prato”, da Estratégia da Biodiversidade para 2030, nem do Pacto Ecológico Europeu.

A promessa de alteração da lei caça4, após o triste episódio da Torre Bela, ficou por cumprir, ficando pendente o objetivo de que a atividade da caça passe a ser positiva para a conservação da Natureza, através de uma gestão das zonas de caça focadas não só no fomento das espécies cinegéticas, mas também na boa gestão dos seus ecossistemas, como já acontece nalgumas raras zonas de caça portuguesas.

O avanço da exploração do litoral tem continuado a permitir a destruição de património, sobretudo no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, onde até habitats protegidos por legislação europeia desapareceram sob o mar de estufas que inunda o Parque. A agricultura intensiva e a construção de empreendimentos hoteleiros em áreas de elevado valor natural e paisagístico progridem a passos largos em todo o país, com particular relevo para as culturas de regadio no Alentejo e Algarve e para os planos para a costa entre Tróia e Melides.

2022 será assim recebido com sentido de oportunidade e apreensão, pois muitas das suas manchas permanecem visíveis há largos anos. Apesar do avanço nas áreas protegidas, foram frequentes e consequentes os atrasos nos planos de gestão das áreas da Rede Natura 2000, e pobres os que chegaram a ver a luz do dia6. Em larga medida, a ineficiência na salvaguarda da Natureza deve-se à permanente falta de recursos humanos e materiais do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas dedicada à efetiva salvaguarda do ambiente, que desta forma se vê privado de uma melhor ação e capacidade de resposta nesta área. Continua a existir espaço para preencher as lacunas que o ano que agora termina deixou abertas e ir mais longe, a fim de enfrentar desafios nacionais prementes. 

É necessário racionalizar e equilibrar a utilização dos recursos hídricos para prevenir a falta de água e evitar aumentar o consumo de água perante a força das alterações climáticas em reduzir a sua disponibilidade. Diretamente associado a este desejo encontra-se a necessidade de integrar o ambiente e a conservação da biodiversidade nas políticas agrícolas, assegurando um real desenvolvimento sustentável.

Os projetos que procuram destruir património em prol de proveitos efémeros devem ser equacionados à luz de uma visão a médio e longo-prazo que tenham por base estratégias integradoras, num equilíbrio entre o ambiente e os fatores socioeconómicos. Isto é válido para a proteção do litoral face à agricultura e turismo, à construção do Aeroporto do Montijo7 e à expansão da energia solar – que deverão ser alvo de uma justa Avaliação Ambiental Estratégica –, à exploração de lítio em áreas classificadas (ou noutras de elevado valor ambiental ou cultural), e ainda às medidas de ajuste à meta máxima de eucaliptal em Portugal inscrita na lei para 2030.

Fruto da intenção da Comissão Europeia de implementar uma estratégia abrangente de restauro ecológico nos seus estados-membros, esta matéria surge como uma das principais oportunidades em 2022. Devem ser aproveitados os mecanismos de apoio para o restauro dos ecossistemas do país, priorizados de acordo com os dados patentes no último relatório do estado da Natureza na Europa8, que designam as florestas e habitats costeiros como sendo os mais ameaçados. Além disto, existe uma proposta europeia para uma nova “Lei de Saúde do Solo” assente no restauro, aumento da resiliência e proteção dos solos europeus até 2050, que poderá configurar-se como uma ferramenta útil para Portugal, dada a sua exposição à desertificação.

Por fim, que em 2022 se veja concretizada a intenção de atribuir à Lagoa dos Salgados o estatuto de Reserva Natural, bem como e às restantes áreas que visam proteger o bem comum em terra e no mar, dando-lhes não apenas um novo título, mas também os meios para que se exerça a sua devida proteção. 

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