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Sexta-feira, Abril 19, 2024

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Autarcas receiam ir contra a opinião dos munícipes sobre mobilidade, diz consultora

Foto: Archademy

Dois consultores da empresa W2G – Way2go, que atua no setor dos transportes, consideraram, em entrevista à Lusa, que os autarcas portugueses “têm receio”, por vezes, de ir contra a opinião dos munícipes quanto às políticas de mobilidade.

“Por vezes até podem querer implementar, mas têm receio em, de alguma forma, ir contra àquilo que são as opiniões dos munícipes”, disse à Lusa o consultor Luís Caetano, numa entrevista conjunta com a colega Madalena Beja, por videoconferência, em antecipação do congresso Cidades que Caminham, que decorre no Porto na quinta e na sexta-feira.

Segundo Madalena Beja, se há 20 anos “o que interessava era o tráfego” na consultoria em transportes, atualmente “há outras prioridades e outras perspetivas de intervenção que tornam tudo muito mais interessante”.

“Acho que a grande mudança que tem havido ultimamente tem sido o direcionamento dos fundos europeus para outros modos que não os modos rodoviários, e isso tem feito com que sobretudo os autarcas tenham adaptado a sua ação a isso”, disse Luís Caetano.

De acordo com o especialista da empresa que já elaborou vários planos para autarquias e comunidades intermunicipais, “a este nível de proximidade os autarcas são muito sensíveis” às opiniões dos munícipes, existindo “sempre um grande medo de fazer coisas mais radicais, ousadas” quanto à mobilidade.

Madalena Beja crê que a comunicação das medidas “é essencial”, e que muitas vezes há “comunicação que não é comunicação”, mas sim “o que as pessoas querem ouvir”.

“Depois, na prática, o que as pessoas querem ouvir tecnicamente nem faz sentido, nalgumas situações”, considerou a consultora, crendo que por vezes “as soluções têm que estar no terreno também para as pessoas perceberem que elas podem funcionar, e quebrar o preconceito”.

Apesar de reconhecer a questão do receio dos autarcas, Luís Caetano afirma que na política de mobilidade existe também “uma dissociação entre aquilo que é a realidade, aquilo que é a opinião pública e aquilo que é a opinião ouvida, ou que se expressa”.

“Isto, obviamente, devido ao impacto das redes sociais neste tipo de processos, nos processos eleitorais e na comunicação”, refere, notando a “diferença entre quem se faz ouvir, que normalmente são aqueles que se sentem prejudicados” e a “opinião geral da população”.

Para Luís Caetano, “as pessoas que estão contentes com aquilo que vai sendo feito não se expressam tanto”, mas mesmo assim os autarcas “têm receio de avançar mais, exatamente pelas reações negativas”.

O consultor considera que “as pessoas nunca vão pedir uma coisa que não conhecem”, acabando por “tentar sempre defender ao máximo aquilo que já têm, e não arriscar com uma coisa que não conhecem e que não têm”.

Porém, diz acreditar que também se trata de uma “questão geracional”, pois nos mais novos já não observa “aquilo que existia há 20 anos, que era fazer 18 anos, tirar a carta e conseguir arranjar um carro o mais depressa possível”.

Luís Caetano refere-se, pelo menos, a uma cidade como Lisboa, que “tem transportes públicos, uma rede de transportes funcional” e uma pessoa, “apesar de todas as deficiências, consegue mover-se sem o carro”.

Ainda sobre a questão geracional, Madalena Beja frisa que há cidadãos mais resistentes à mudança, uma vez que, “como sempre viveram assim, caminhando para velhos mais difícil é, até fisicamente, alterar essas opções”.

“Eu acho que também haverá a aposta nos mais novos, e perceber que realmente os votantes, daqui a 10 anos, se calhar já têm outra visão”, disse a consultora à Lusa.

Questionada sobre se os autarcas estão reféns das vontades imediatas das populações, Madalena Beja respondeu que o estão “parcialmente”, mas ressalvou que “também têm aprendido em todo este processo”, recordando a era inicial dos Planos de Ação de Mobilidade Urbana Sustentável (PAMUS), que remontam a 2015.

“Tenho esperança que uma próxima geração possa ser feita com outra calma, e mais focada, em vez de ter sido aquele processo louco”, disse Madalena Beja.

Luís Caetano salientou que aquela geração de planos “chamavam-se Planos de Ação”, e não eram “propriamente os SUMP [Planos Urbanos de Mobilidade Sustentável]”, que são “normalmente planos de um nível mais estratégico, que depois podem continuar por planos de ação em cada um dos setores da mobilidade”.

“Boa parte do trabalho dos consultores dessa área era fazer compilação de medidas e propostas que os municípios de cada uma das comunidades [intermunicipais] tinham previsto e, portanto, não houve, como  Madalena diz, um tempo para maturar tudo o que era diagnósticos, e fazer uma análise muito aprofundada do que é cada um dos territórios, para a partir daí gerar medidas”, relatou.

O consultor disse esperar que no âmbito do programa de fundos europeus Portugal 2030 haja “oportunidade para fazer isso”, mas disse não saber “se vai haver muito tempo para isso”.

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